domingo, 29 de agosto de 2010

Aprender sempre

A formação continuada não é moda passageira. Reflete o mundo cada vez mais veloz em que vivemos, que se renova a cada instante

Ricardo Prado (novaescola@atleitor.com.br)

Era uma vez um tempo em que as pessoas gastavam uma dúzia de anos na formação básica, mais metade disso numa faculdade — quando chegavam lá — e pronto, não precisavam estudar mais. Cada um começava uma carreira profissional para os 30 ou 40 anos seguintes. Esse tempo se acabou. Nunca houve tanta informação, tão rápida e tão disponível para tanta gente. Depois da internet, nos tornamos seres "informívoros".

Nesse admirável mundo que cabe na tela do computador, mesmo as instituições mais enraizadas sofreram abalos. "Antigamente a escola tinha a oferecer toda uma bagagem de conhecimentos que não podia ser adquirida de outra forma. Representava um valor único, não só do ponto de vista dos conteúdos, mas também de ascensão social", analisa Bruno Dallari, especialista em Ciência da Cognição do Departamento de Lingüística da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. "Hoje ela perdeu esse lugar e não pode mais repousar na especificidade de conhecimentos que só seriam conquistados lá."

Se a escola mudou os alunos também. "O jovem de hoje é mais curioso e interessado do que o de antigamente, não desinteressado, como muitos dizem. Por ser menos ingênuo, ele questiona o professor. A maior oferta de informação também faz com que ele crie um percurso próprio na aquisição do conhecimento", afirma Dallari.

Espaço de improviso

Se a escola e os alunos mudaram, muitos professores seguem o mesmo caminho. Ana Rosa Abreu, que esteve à frente dos Parâmetros em Ação, do Ministério da Educação, compara o professor a um músico de jazz, que precisa saber improvisar. Mas destaca: só faz isso bem quem tem respaldo de estudo, leitura e planejamento e consegue trabalhar coletivamente. "Quanto mais o professor tematiza com seus colegas o que acontece na sala de aula, mais tem condições de lidar com questões inesperadas. Quando esses grupos se solidificam, muda a lógica interna. Por isso o ideal é trazer questões, não saber tudo. Só assim se cria a noção de que todos aprendem."

Um processo lento

Ana Claudia Rocha, coordenadora de projetos institucionais do Museu de Arte Moderna de São Paulo e consultora pedagógica do Sesi, trabalha com capacitação de professores em redes municipais há dez anos. Para ela, a formação continuada só se torna eficiente quando é permanente. "No primeiro ano não é possível enxergar nada de novo. Em São Caetano do Sul, por exemplo, 650 educadores da rede vêm se capacitando há seis anos e só agora vemos resultados expressivos, pois eles estão mudando de fato sua prática", destaca.

Para exemplificar a lentidão desse processo ela costuma usar dois textos escritos pela mesma professora sobre o dia-a-dia da sala de aula. A evolução na capacidade de escrever, na solidez dos conceitos e na gama de soluções é evidente de um texto para outro. O segundo parece até obra de outra pessoa. Uma aprendizagem que durou cinco anos. "A maioria das pessoas acha que a mudança se dá em oito meses, um ano, no máximo dois anos. Doce ilusão", diz Ana Claudia.

Ou seja, os próprios professores esperam de si uma competência impossível de ser alcançada em curto prazo. Junte problemas na formação inicial, a insegurança natural na hora de testar novos caminhos e descontinuidades administrativas para perceber que não é numa imersão de fim de semana que o professor renova sua prática.

As teorias construtivistas da aprendizagem mostram que o conhecimento consiste numa reestruturação de saberes anteriores, mais que na substituição de conceitos por outros. A passagem de uma didática centrada na transmissão do conhecimento para outra baseada na sua construção não nasce de um dia para o outro.

Por isso, tão importante quanto formar um grupo na escola e começar a estudar é aliar paciência e persistência. Até porque não há razão para ter pressa quando entramos numa estrada que nunca termina.

Data da pesquisa: 29 de agosto de 2010

http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/aprender-sempre

TECNOLOGIA NA AULA

TECNOLOGIA NA AULA


Chamar as crianças e os adolescentes de "nativos digitais" já se transformou num lugar-comum. De fato, eles têm intimidade com os computadores, além de interesse em navegar pela internet. Essa é uma característica que deve ser aproveitada pelo professor para trabalhar os conteúdos de currículos da alfabetização ao 9º ano. Ao mesmo tempo em que existe a necessidade (e a vontade) de incorporar as tecnologias no processo de ensino e aprendizagem, surge a dúvida: como fazer isso no cotidiano?

Para mapear o uso dos computadores e da internet, a Fundação Victor Civita (FVC) encomendou ao Ibope uma pesquisa em 400 escolas públicas de capitais brasileiras (Belém, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Luís e São Paulo). O levantamento, que tem patrocínio da Abril Educação, do Instituto Unibanco e do Itaú BBA, traz dados valiosos sobre a infra-estrutura, a formação de professores e a importância do planejamento escolar para o bom uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs).

Ter equipamentos é a condição básica para realizar atividades pedagógicas diferenciadas (confira alguns dados da pesquisa abaixo). Pelo menos em relação à infra-estrutura, as escolas das cidades pesquisadas estão em boa situação: 98% têm computadores. Segundo o levantamento, o acesso à internet, um item importante para a realização de algumas ações pedagógicas, já é feito por meio de conexão de banda larga em 83% das instituições. Quando se expande o olhar para além das capitais, porém, a realidade é menos otimista. De acordo com o Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC) de 2008, apenas 35% das instituições de ensino espalhadas pelos mais de 5,5 mil municípios têm acesso à internet.



A formação para o uso de tecnologias ainda é mal avaliada

Usar o computador e a internet em prol da aprendizagem exige atenção aos conteúdos. Apesar de 29% das escolas terem participado de formação em TICs nos últimos 12 meses, a maioria considera os cursos pouco úteis para o dia a dia em sala de aula. Além disso, 56% dos entrevistados consideram que sua formação inicial não os preparou para inserir recursos tecnológicos nas aulas. "O ideal é priorizar os conteúdos específicos das disciplinas e incluir as novas tecnologias como ferramentas para facilitar a aprendizagem", afirma Regina Scarpa, coordenadora pedagógica de NOVA ESCOLA e da FVC.

Outro diagnóstico interessante diz respeito ao planejamento escolar. A pesquisa detectou que a inclusão do computador no projeto pedagógico faz diferença no nível de utilização deles. Noventa e quatro por cento das escolas que inserem o recurso em seu projeto fazem um uso pedagógico mais avançado, como a criação de sites e blogs. O mesmo vale para os professores. Em 67% dos casos, os que consideram as tecnologias no roteiro das aulas elaboram atividades mais interessantes.

Se por um lado os investimentos em infra-estrutura já permitem que muitas escolas, pelo menos nas principais capitais, tenham computadores e acesso à internet, por outro os professores carecem de formação focada em suas disciplinas. Saber operar programas e equipamentos - que mudam cada vez mais rapidamente - não deveria ser a principal demanda de gestores e professores. O verdadeiro desafio está em associá-los aos temas de estudo para realizar melhor a tarefa de ensinar.

Data da pesquisa 29/08/2010

http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/diretor/tecnologia-aula-computador-escola-pesquisa-fundacao-victor-civita-aprendizagem.